quarta-feira, 15 de agosto de 2007

A RECONSTRUÇÃO DA NOSSA VIDA EM CRISTO - PARTE 2

Texto de Joel Theodoro,
pastor no Rio de Janeiro
Fotos: http://www.flickr.com


Vou começar este pensamento, que complementa a parte 1 deste assunto, com uma estorinha bem interessante que nos fala de algumas coisas muito boas, como companheirismo, força de vontade, vigor e persistência. Mas também nos fala de algumas coisas ruins, como teimosia e morte. A estorinha das mosquinhas amigas pode ser encontrada em muitos lugares e em muitas versões. Em geral as pessoas contam a primeira parte apenas, que é de fato uma grande lição de vida. Mas a mosca protagonista dela continua numa nova aventura, a segunda parte, a qual também conto abaixo. É mais ou menos assim:

A mosca persistente
Parte 1: Duas moscas amigas voavam pela cozinha quando caíram num copo de leite frio. Uma delas era muito forte e valente, e a outra era muito persistente. Quando perceberam que iriam morrer, começaram a tentar sair dali, mas as paredes do copo eram lisas e não conseguiram escalá-las. Com as asas molhadas, a situação piorou. A mosca forte debateu-se vigorosamente por muito tempo, até à exaustão, quando perdeu os sentidos e afundou para a morte. A mosca persistente batia contra o leite de maneira menos vigorosa, e, por demorar a se cansar, percebeu que no lugar em que estava flutuando formava-se uma leve camada de manteiga. Exausta, conseguiu subir e, depois de secar suas asas, levantou vôo. Essa parte nos mostra a vitória da perseverança sobre a força bruta.
Parte 2: Mas, num outro dia, a mosca persistente voava pela cozinha com outra mosca, sua nova amiga, quando se descuidou e caiu em outro copo, desta vez de água. Com base em sua experiência anterior, começou o processo de bater as asas na esperança de fazer nova porção de manteiga. A sua amiga, que não tinha caído na água, pousou na borda do copo e gritou: “-Amiga, há um canudo ali. Nade até ele e suba”. Ao que ouviu a resposta: “Pode deixar que eu consigo sair daqui igual da vez passada!” Como de água não se faz manteiga, a mosca persistente se debateu até perder as forças, desmaiou e também afundou para a morte.
Moral da estória: experiência é algo bom, mas nem sempre serve para resolver todos os casos.

É muito comum que a nossa vida espiritual tenha altos e baixos e é comum também que enfrentemos inúmeros momentos de desânimo ao longo da caminhada. Por isso mesmo precisamos de redobrada atenção ao que nos acontece, a fim de que tenhamos sempre em mente que Deus já previu determinadas situações e já nos acenou com a solução para elas.
Quando paramos para pensar naquilo que nos desanima, provavelmente nos lembraremos de episódios que colaboraram para a nossa míngua espiritual. Não devemos menosprezar nem as circunstâncias da vida nem o universo espiritual maligno, pois ambos igualmente militam contra nossa fé.
Em meio a lembranças que resgatamos em momentos de crise, certamente nos lembraremos também de quão boas coisas já experimentamos na presença de Deus e nos lembraremos de várias vitórias alcançadas. O problema está em fazer dessas lembranças um apoio e um recordatório da fé sem ultrapassar os limites e imaginar que fatos do passado por si próprios são suficientes para nos livrar de novas lutas. Experiência é muito boa, mas nem sempre serve para dar vitória no presente.
No processo de reconstrução de nossa vida com Deus, é certo que enfrentaremos muitas adversidades. Começamos por imaginar o que acontecia com o povo mencionado no livro de Esdras, especialmente no trecho que me interessa para esta reflexão, no capítulo 3, versículos de 3 a 6. Algo de enorme valor para nosso aprendizado é lermos que eles estavam resolutos a reconstruir altar, templo e muros de qualquer maneira, enfrentando quaisquer oposições. Na primeira parte chegamos a determinadas conclusões sobre o episódio, e uma delas dizia respeito a começar a cultuar a Deus com aquilo que dispomos, ou seja, não podemos de forma alguma esperar o momento mais perfeito e oportuno para iniciar o culto. Se o que temos é um monte de pedras, façamos o altar e comecemos a sacrificar!
Uma vez iniciado o processo de culto individual, no qual se busca o recomeço de um processo junto a Deus, entendemos que é chegada a hora de aproximar ainda mais nossa vida do altar de Deus, aplicando nossos corações ao desejo de Deus. Mas não podemos nos enganar: isso não quer dizer que as coisas simplesmente irão para o lugar sem nenhum esforço adicional.
Precisamos entender alguns princípios que darão vitória e fortalecerão nossos corações, levando-nos à reconstrução de nossas vidas em Deus:
Em primeiro lugar, é necessário estar preparados, pois o processo de reconstrução pode se dar em meio a muitas dificuldades, diante de muitas das quais tememos perecer. Isso pode nos levar a um outro processo interior, o medo de falhar ou o medo de ser vencido pelo que nos cerca. Os hebreus de Esdras estavam reconstruindo as suas porções em meio ao medo que sentiam por tudo que se levantava contra eles. Mas é bom jamais nos esquecermos que a fé cristã não faz de nós super-homens, mas pessoas que sabem que, mesmo com inimigos a nossa volta, o Senhor é e será sempre o maior. Não é a rotina de luta nem o tamanho da mesma ou dos inimigos que mais deve nos impressionar. Antes, nossa atenção deve estar sempre nos feitos e promessas do Senhor Deus, o único Deus do Israel de Esdras e da Igreja de hoje. Qual seria a motivação maior para que nossa operosidade no momento da reconstrução não cessasse? As dificuldades que surgem ao nosso redor têm uma só finalidade, que é paralisar nossas iniciativas espirituais. O que precisamos é ter certeza absoluta que, a despeito das lutas e das circunstâncias, Deus continua sempre adiante de nós, zelando por nós, cuidando para que sejamos reconstruídos em sua presença.
Na linguagem do texto lido, esse momento deve obrigatoriamente permitir duas coisas: o altar precisa ser concluído conforme a ordem de Deus e o culto precisa começar de acordo com o que Deus deseja. Isso significa que não basta reconstruir algo esteticamente, mas é necessário fazê-lo espiritualmente, ou seja, de acordo com o que foi previamente estabelecido por Deus como altar e como culto. Por maior e mais “sincero” que seja o sacrifício, se estiver sobre altar que não segue o modelo de Deus ou se for dedicado num culto fora dos padrões do Senhor, ele será rejeitado por Deus. Precisamos, portanto, concluir a reconstrução do altar e reiniciar o culto, mas isso só servirá para nossa reconstrução interior se estiver nos padrões de Deus.
Por sua vez, a retomada do culto que agrada a Deus segue uma ordem vista no texto:
1. primeiro o culto imediato e pessoal - estes são expressos no texto como os sacrifícios da manhã e da tarde. Ou seja, são aqueles que podemos apresentar a Deus em todo o tempo, sem depender de estarmos reunidos. São sacrifícios de louvor individuais, pessoais, que fazem parte de nossa responsabilidade de vida cristã.
2. depois, o culto congregacional - somente depois que o indivíduo é restaurado ele pode entender o que realmente representa cultuar em comunidade. Antes disso, ele pode estar junto, cantar junto e até orar junto, mas não consegue entrar no processo de culto a Deus, que pode ser:
· a grande celebração, como a festa das cabanas, em que o povo se reunia uma vez por ano e
. o culto sistemático da comunidade, como os holocaustos regularmente oferecidos a Deus.
O que isso nos diz hoje? Isso nos responde algumas perguntas, em geral feitas quando temos algum tipo de problema ainda não resolvido em nossa espiritualidade. Respostas possíveis: O cristianismo não prevê o culto individual permanentemente; A comunidade cristã foi estabelecida por Deus e, mesmo que nela haja problemas (e há muitos), ela representa a comunidade dos santos; A presença nas celebrações comunitárias é de fundamental importância para a vida com Cristo.
Fechamos esta reflexão pensando juntos: por qual razão a reconstrução do templo vem depois da reconstrução do altar, se este deveria estar dentro daquele? Usando nossa analogia com o que foi dito, interpretamos a mesma pergunta assim: porque a comunidade é reconstruída depois do indivíduo se este deveria estar dentro dela? Ambas as respostas nos levariam a uma só sentença: Deus nos trata como indivíduos e não por lote. Para nada servimos se estamos inseridos no contexto congregacional, mas temos a nossa vida embotada pelas práticas do mundo e se ainda não acordamos para a obra de reconstrução de nossa espiritualidade cristã. O indivíduo vale muito mais que a coletividade, pois Deus nos chama e nos conhece pelo nome. Mas é inegável que ele deseja muitos indivíduos como eu e você para que, depois de restaurados, formemos uma coletividade. Da mesma forma podemos pensar que a reconstrução do templo, ou da coletividade, depende previamente de nossa reconstrução individual. Ora, a Igreja é composta de gente salva, gente reconstruída. Os alicerces do templo somente serão lançados depois do altar e do sacrifício de cada um de nós.Que esses pensamentos baseados na Bíblia e num relato de reconstrução nos levem a buscar de fato a reconstrução de nossa espiritualidade. Que isso nos estimule a cultuar a Deus mesmo que se levantem muitas e terríveis dificuldades e oposições. Mesmo que sintamos medo e pavor, precisamos confiar em Deus. Precisamos ter coragem para sair do lugar de conforto aparente e ir em direção a algo novo, entendendo que nem sempre o sucesso de construções passadas representarão o sucesso na atual reconstrução.

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