pastor no Rio de Janeiro
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Uma das coisas que acompanham o homem desde seus tempos primitivos é a realidade do transcendente, com a inevitável realidade paralela da fé para entender e refletir sobre esse mesmo transcendente. Mas não tem sido uma viagem fácil para nossa raça o crer que algo imaterial possa ser real, mesmo quando nos vemos cercados de elementos que, se não são imateriais, pelo menos são de difícil percepção, como ar, som, sem falar em outros elementos, imateriais, reais, porém absolutamente imponderáveis, como o pensamento, por exemplo.
Creio que parte de nosso problema se baseia sistematicamente em processos pelos quais a nossa História nos apresenta a nós mesmos como o centro de tudo, em que nossa razão desponta como algo acima de qualquer suspeita e a nossa capacidade de gerir os destinos temporais e eternos estão espalmados em nossas mãos fortes e firmes. Nossos pensamentos e pensadores atingiram níveis impensados, com reflexões profundas e pertinentes, com a sagaz capacidade de sondar interiores humanos e distâncias cósmicas de maneira imaculada. Só não conseguem perceber que seus pensamentos são para si como máscaras e que, como toda fantasia, um dia sairão para dar lugar à realidade.

Esse olhar rotundo e cíclico provoca em nós uma espécie de orgulho que impede que vejamos a nossa real desgraça e a nossa roupa enxovalhada pendurada atrás da porta da nossa existência. Um interessante conto de Andersen fala de um rei soberbo e orgulhoso, cujo desejo de sobrepujar tudo e todos era largamente conhecido. Trata-se de “A roupa nova do rei” ou, em outras traduções, “A roupa nova do imperador” (se quiser ler a narrativa toda, clique aqui para baixar o e-book gratuitamente). Ficarei com o rei mesmo. Então, no reino, seus súditos entenderam que o melhor seria concordar sempre com o rei e seus caprichos. Uns embusteiros, chegando à cidade, aproveitaram-se da situação e, acima de tudo, das características do rei, e apresentaram-se como alfaiates capazes de fazer uma roupa tão especial que somente eles e o rei seriam capazes de perceber. Passados os dias da alfaiataria, e para poupar os leitores do enredo completo, a narrativa mostra um rei absolutamente nu desfilando por entre súditos espavoridos com a sandice do monarca, mas com os sorrisos e as aprovações públicas - falsos, é claro - demonstrados enquanto o rei passava pelas ruelas de seu reino. Assim temos sido: reis que se enganam a si mesmos pela soberba e pelo orgulho; súditos que fingem entender e ver o que não vêem nem entendem; alfaiates que cozem o que não podem somente para ludibriar e enganar os tolos.
Penso constantemente no fato de não sermos incapazes, no sentido intelectual, de ter e expor fé, no sentido cristão da palavra. Mas somos incapazes, no sentido social e comunitário, de entender que isso seja razoável e, até, normal e inteligente. É um exercício complexo hoje um jovem qualquer dizer no meio em que está que acha verdadeiras as palavras que dizem que “no princípio Deus criou os céus e a terra” (Gênesis 1.1), mesmo quando essa narrativa expõe posteriormente as razões e os meios para todo o desenrolar do processo. Ao contrário, é demonstração de grande inteligência e sagacidade ele afirmar que de um algo que não existia, por razões desconhecidas, sem explicação alguma, o caos se tornou absolutamente organizado, principalmente se uma inimaginável explosão tiver originado tudo.
Estou convencido que a fé necessária para crer na segunda afirmativa é muito mais intensa do ponto de vista da lógica humana que para crer na primeira.
Se alguém conhece um mínimo de Física, poderá ajudar daqui por diante. Embora não seja profundo conhecedor dessa área do conhecimento, não me vem à mente nenhum princípio pelo qual possamos explicar qualquer explosão ou desordenação absoluta se tornar algo ordenado sem a intervenção de um elemento ordenador. Como a ausência poderia dar lugar à presença de tudo? Como o caos e o nada poderiam ceder espaço à ordenação e ao tudo existente?
As pessoas que crêem na afirmativa da gênese bíblica continuam a sua leitura nos versos 2 e 3 e entendem o que seus opositores não serão capazes de perceber como algo razoável: “Era a terra sem forma e vazia; trevas cobriam a face do abismo, e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas. Disse Deus: ‘Haja luz’, e houve luz”. Estes sabem responder que um agente participou efetiva, deliberada e inteligentemente da ordenação do caos absoluto, enquanto os outros, infelizmente, continuam dizendo ao seu rei “Ó rei, que belas vestes festivais!” E o rei, feliz, continua sorrindo alegremente ao seu populacho. Só não se apercebe que, em dado momento, uma inocente criança (sincera, é claro), grite “O rei está nu!”
Voltaire trata de questão semelhante, deixando-nos no ar uma questão sobre a velhinha de seu conto: seria melhor a ignorância feliz ou conhecimento infeliz? De certa forma me opondo e parafraseando nosso escritor e filósofo, cujas obras recomendo veementemente, em especial “Cândido, ou o otimismo”, creio ser absolutamente natural para os que vêem a palavra de Deus
como fonte de seus entendimentos de mundo simplesmente optar por uma via que Voltaire não percebeu: é possível chegarmos ao conhecimento feliz.Por trás de nossas sensações, das posições que adotamos, dos pontos de vista que assumimos, há sempre mais do que podemos ver a olhos nus. Nos casos dos dois tipos de pessoas acima mencionados, isso também se faz verdadeiro. Não há postulados inocentes ou assépticos: há pressupostos, os quais regem nossas decisões e nossas atitudes. Continuaremos a tratar de como é preciso ter fé para não crer. Por enquanto deixo para vocês a lembrança das duas cadeiras do universo de Francis Schaeffer: para ele, há uma sala hipotética mobiliada com apenas duas cadeiras, nas quais sentam-se dois pensadores, sendo um cristão e outro materialista (sugiro a leitura de “Morte na cidade”, Editora Cultura Cristã: em seu último capítulo você entenderá esta imagem de Schaeffer). Faço força para pensar diferente neste momento: a mesma sala, nua de todo, na qual se vê apenas uma janela. Lá fora há algo a se ver. Pergunto: o que será visto pelo cristão e o que será visto pelo materialista de Schaeffer?
A eternidade tem sido discutida como processo filosófico, psicológico, artístico e literário, além de ético e religioso. Inúmeras são as alternativas apresentadas, mas apenas uma faz parte do pensamento cristão. Como alternativas humanas, um sem-fim de possibilidades se abriram ao homem, mas o mais dramático é que nenhuma delas nos satisfaz de fato. Por qual razão? Porque nenhuma delas responde as questões mais profundas que carregamos, como que numa genética ancestral a partir da qual sabemos - quase que numa espécie de instinto espiritual - que somente há um caminho possível, que é o caminho que o próprio Deus nos mostra desde tempos imemoriais.
No capítulo 21 vemos uma bela seqüência de informações em que aquele que tiver em Deus poderá se encontrar no futuro eterno. Esse Deus que preparou algo novo para mim preparou, também, e de maneira especial, um novo lugar para que seus filhos habitem pela eternidade. Será um lugar em que Deus estará todo o tempo (versículo 3), quando o apóstolo João escreve que “agora o tabernáculo de Deus está com os homens, com os quais ele viverá. Eles serão os seus povos; o próprio Deus estará com eles e será o seu Deus”. Isso nos leva de volta a um estágio de comunhão e intimidade com Deus como o homem experimentava costumeiramente antes da Queda. Eu vou também para um Deus que preparou um lugar sem nada triste ou ruim (versículo 4). Um lugar que resplandece com a glória de Deus, cujo brilho e beleza não encontram palavras precisas na pena do autor sagrado. Esse novo lugar preparado por Deus vai realmente além de nossa imaginação, sendo totalmente puro, que é o que João quis nos dizer quando fala de ser um lugar cuja “rua principal da cidade era de ouro puro, como vidro transparente” (versículo 21). Finalmente, ao falar desse lugar que Deus prepara para nós, João reforça a idéia inicial de que nela só entrarão os que tiverem seus nomes registrados no livro da vida. Diz ele que ali entrarão “unicamente aqueles cujos nomes estão escritos no livro da vida do Cordeiro” (versículo 27).
Qual, então, a melhor resposta para a pergunta “para onde eu vou?” Ela consiste em descansar na resposta que a própria Bíblia nos dá: eu vou de volta para Deus. Diretamente para Deus. Não vou apenas a um lugar celestial, mas vou de volta ao Pai! Saber que eu vou para Deus deve mexer comigo. Deve ser capaz de me fazer diferente do que sou, de renovar minha fé e esperança.

Hernani se demonstrava atônito, mas também orgulhoso. Ao mesmo tempo que claramente era confrontado por algo que era mais forte que seus pensamentos, também não deixava isso transparecer muito. Desejava, através de uma sabedoria empírica, provar que nossa fé em um livro e um Cristo era tola, mas se tornou um tolo ao apresentar uma visão da vida totalmente irracional (Romanos 1.22).
- Eu o desafio a ler a Bíblia! (anteriormente eu perguntei se ele já havia lido - respondeu que não).
Gostaria de me ater a Gênesis, dos capítulos 1 a 3. Vamos pegar alguns trechos dessa passagem para obtermos nossa resposta. De onde eu vim? Vou entender para esta reflexão que sou ser humano e quando me referir a mim nesta leitura, estarei me pondo no lugar de qualquer ser humano.
A segunda coisa que afirmo é que eu vim das mãos de um Deus que me amou.
Assim, após estas breves leituras, entendo poder dizer que a melhor resposta para a questão apresentada “de onde eu vim?” consiste em descansar na resposta que a própria Bíblia nos dá: eu vim de Deus. Diretamente de Deus. Por isso guardo alguns atributos originais em minha humanidade. Por isso há meios de resgatar atributos originais de minha espiritualidade. Não vim de lugar algum! Eu vim de alguém, como um filho pode responder que veio de seus pais com maior propriedade do que dizer que veio de algum lugar.Saber que eu vim de Deus deve mexer comigo. Deve ser capaz de me fazer diferente do que sou. Cabe a mim e a você aceitarmos o fato de termos vindo de Deus, independente do grau de relacionamento que tenhamos com ele; precisamos nos alegrar por esse fato todo o seu coração; precisamos começar a nos voltarmos para a retribuição pessoal desse imenso amor de um Deus que amou a mim e a você quando eu e você estávamos (ou estamos?) mal.

