sábado, 22 de agosto de 2009

COMO MUDAR A IGREJA HOJE?

Texto de Joel Theodoro,
pastor no Rio de Janeiro
Imagens: http://www.flickr.com/


Um chamado ao pensamento
A Igreja, ampla, vai bem, graças a Deus.
Os que vão à Igreja em caráter existencial estão existencialmente bem, graças a Deus.
Os que compõem a igreja, comunidade, em caráter institucional e comunitário vão mal, a despeito de Deus os acompanhar.

Pensamentos sobre Igreja e igrejas
Cresci achando que a Igreja era perfeita. Estou feliz por ver que cresci com bom entendimento a esse respeito. Só demorei a perceber que a Igreja é composta por igrejas. É aí que está o problema da Igreja de hoje: as igrejas de que ela se forma.
A Igreja é o Corpo pelo qual Deus continua sua obra entre os homens até que se terminem nossos dias como espécie, mas, paradoxalmente, a Igreja depende de igrejas para que tal missão se complete. Eu me pergunto de quando em vez se é assim mesmo...
A Igreja não é vista, mas as igrejas são vistas. Por isso a Igreja nos pede uma relação de fé e espiritualidade, mas as igrejas nos pedem uma relação de comportamentos e comprometimentos, além de quererem nos ver fisicamente todo o tempo.
A Igreja é regida apenas por Deus, tendo Cristo como cabeça soberano e o Santo Espírito como agente entre os homens, mas as igrejas deixam essa relação de lado e, muito comumente, são co-regidas - por vezes totalmente regidas - por homens apenas, na constante corrida por formatações e ampliações de seus impérios.
As gentes da Igreja são santas e imaculadas, desde já, aos olhos do Criador, mas as gentes, aos olhos dos gestores-imperadores das igrejas são números e cifrões que fazem de seus projetos elementos cobiçados e copiados pelos aprendizes de imperadores da fé.
A Palavra da Igreja salva, consola, dá paz e leva a Deus, mas as palavras das igrejas torcem a alma, impõem novos jugos, roubam a possível paz e levam à dependência toxicológica das missões, congregações, apostolados, episcopados, comunidades e tantos outros nomes de igrejas.
A Igreja tem suas portas abertas pela graça irresistível de Deus e o que por elas entra encontra repouso para a alma atribulada, mas as igrejas têm suas portas abertas para receberem os incautos famintos por vida e os que por elas entram são enredados até à alma, que, uma vez enganada e atrofiada, encontra enorme dificuldade em se libertar de tais processos.
Esse discurso de paradoxos e antíteses poderia se estender por páginas a fio. Mas apenas queria expressar que uma reflexão de alma nos leva a distinguir claramente a Igreja das igrejas.
Por causa da Igreja há milhares e milhares de salvos indo para Deus. Por causa das igrejas, outros tantos milhares estão correndo para longe de Deus e, muitas vezes, crendo estarem se aproximando dele.

Pensamentos sobre o que vemos e esperamos
Olhando para a Igreja sob o olhar ontológico, vemos uma Igreja que continua, sim, mas sem o amparo de suas igrejas. Claro que há exceções, mas estamos tratando do aspecto geral.
Falando de evangélicos (termo genérico), temos dois grandes problemas atuais e ambos nos afastam do Ser que deveria ser central na Igreja: o nominalismo e a Teologia Liberal. Sobre essas duas pragas, Robinson Cavalcanti, bispo anglicano da Diocese Anglicana do Recife (http://www.dar.org.br/) diz em artigo de sua autoria:
“Na universidade, lendo mais e conversando com viajantes, entrei em contato, chocado e decepcionado, com a existência da categoria de protestantes nominais, especialmente em igrejas ligadas ao Estado, com bispos nomeados e pastores funcionários públicos. Um velho pastor me falou que aqueles países se tornaram protestantes ‘por decreto’, e que a fé não se transmite biologicamente às novas e esfriadas gerações. Na ABU, discipulado pelo pastor Dionísio Pape, fui aprender que existia uma outra estranha categoria de protestantes: os liberais. Enquanto os nominais pareciam crer de fora, os liberais descriam dentro da Igreja. Ele me falou da influência racionalista do iluminismo, via faculdades de teologia, nas universidades públicas, dos professores de teologia e clérigos profissionais que, embora chamados de luteranos, presbiterianos ou anglicanos, não acreditavam no que Lutero, Calvino ou Cranmer haviam escrito, inclusive as históricas confissões de fé de suas igrejas.” (Cavalcanti, Robson. Protestantismo: o que deu errado? In: Revista Ultimato, Ed. 306, maio-junho de 2007).
Com tudo isso que vemos em meio ao celeiro cristão, parece que uma coisa está perdidamente confirmada entre nós: não sabemos mais em quem temos crido. As igrejas perderam o referencial cristológico e perderam o rumo.
Se perguntado a respeito de sua fé, dificilmente um cristão de nossos dias saberá responder a perguntas simples como “porque você é cristão?”, ou “porque você diz que segue a Jesus?”, ou “você pode me explicar o que é ser salvo por Jesus?”, ou ainda “precisamos mesmo ser perdoados de alguma coisa, já que somos tão bons?”. E a pior delas seria “em que você crê finalmente?”
Sentimos muito. Experimentamos muito. Mas não sabemos nada de Deus. Muito menos vivemos Deus. Isso é o que andam chamando de avivamento das igrejas. Pode até ser, mas não o da Igreja.
Mas o que será que podemos esperar para mudar tudo isso? Precisamos de um retorno imediato aos grandes e fundamentais temas do cristianismo. Esses temas precisam retornar ao lugar de onde nunca deveriam ter saído por uma simples razão: eles tratam do Ser central do cristianismo, o próprio Cristo e, quando saem de sua centralidade, deixam espaço para que outros aspectos ali entrem e dominem. Por exemplo, quando passamos a ter a análise de nossa fé pela ótica do Iluminismo, abrimos a porta para a Teologia Liberal entrar e se fazer senhora de muitas paráfrases do cristianismo protestante.
Precisamos voltar a viver a nossa fé de maneira simples, crendo na Palavra revelada como ponto final de nossa fé. Precisamos crer que o mar se abriu sem a preocupação de descobrirmos se ventos sopraram: apenas crer que o povo passou e foi salvo! Deixamos de crer que Deus salvou o povo porque não entendemos como as águas se abriram e, assim, perdemos o mais importante por esperarmos ver o que jamais veremos!
Precisamos, paradoxalmente, retornar a uma fé que, embora simples e verdadeiramente crédula, seja de arrazoamento e seja inteligente. Mas essa inteligência deverá seguir os parâmetros de Deus e não os do mundo. Precisamos deixar de parecer inteligentes para o mundo e nos lembrarmos que precisamos voltar a alegrar o coração do Pai Amado.
Precisamos abandonar as modas e modismos, as coreografias malditas, as canções mântricas amaldiçoadoras da mente e desgraçadoras do coração, precisamos deixar as coletas feitas para a compra de coisas sem propósito de igreja e montagem de mega-instituições apinhadas de gente que não valem por um punhado de cristãos. Claro que tudo é feito em nome de Deus. Creio que Ele deve estar cansado de ver Seu nome tomado à toa, quase nunca pelos de fora, mas quase sempre pelos de dentro das igrejas.
Precisamos, então, voltar às canções simples que falem da poesia do Criador, que enlevem a alma, que descansem o coração, que manifestem a graça, precisamos retornar às capelas simples nas quais os poucos valiam por multidões. Precisamos ver nos recursos a chance de falar mais desse nosso Deus, acessível e simples. Mais dele e menos de nós. Mais de Seu amor e menos de nossos impérios. Mais dele e menos de nossas conquistas. E precisamos fazer isso em nome de Deus, de modo temeroso e singelo. Com o coração trêmulo, embora confiante, diante dele.
Precisamos falar de novo em justificação pela fé, na graça de Deus, em Sua soberania. Precisamos falar de novo que o homem vive naturalmente em pecado e, a não ser que seja achegado a Deus, terá morte eterna. Sim! Não falamos mais em morte e salvação eternas. Precisamos falar de novo em autoridade das Escrituras, em novo nascimento, no fruto do Espírito Santo, na necessidade do arrependimento e da santificação.

Como mudar a igreja hoje?
Por tudo que refletimos, creio que a resposta é simples e direta. Para mudar a igreja hoje (igreja, não Igreja), precisamos tirar da igreja tudo que não for Cristo e voltar com Cristo para ser novamente tudo na igreja. Com isso a igreja voltará a se parecer com a Igreja. Essa é a mudança de que precisamos. E o resto virá depois.