quinta-feira, 25 de agosto de 2011

EU ME AMO. EU ME ADORO!

Joel Theodoro é pastor presbiteriano no Rio de Janeiro
Imagens: www.flickr.com

Muita gente boa não presta atenção, mas vive com uma só finalidade: dar prazer a si próprio. Isso não é de hoje, uma vez que o sentimento e a necessidade de prazer acompanha o ser humano desde sempre. E há bons e legítimos prazeres na vida, mas o prazer, pelo prazer pura e simplesmente, não pode nem deve ser o fim maior a se buscar na vida.

Ainda entre os helênicos, o hedonismo escrevia nas linhas da História o que seria, talvez, a primeira sistematização e defesa aberta de tal sentimento. O termo vem do vocábulo ηδονή (hedonê), origem do pensamento que hoje conhecemos como hedonismo.

Hedonismo nada mais é que a teoria que o prazer deve ser buscado como bem supremo, como finalidade de tudo para a nossa vida. Alguns pensadores e suas escolas ao longo da História pensavam que o prazer deveria ser buscado irrestritamente; outros, que deveria ser apenas em nível sensorial. E assim temos uma vasta gama de possibilidades. Mas, no fundo, o que se busca com o hedonismo é a satisfação de si mesmo, custe o que custar.

O hedonismo, por suas características próprias, tende a ser hipócrita e egoísta. Hipócrita porque o infeliz passa a vida tendo surtos de prazer momentâneo e entende isso como uma vida de prazeres. Egoísta porque, para que alguém sempre tenha prazer, provavelmente alguém deixou de tê-lo, já que nem todo prazer é compartilhado em igual sensação e profundidade por todos.

Chegamos aos dias de hoje. Tornamo-nos uma sociedade hedonista. Totalmente interessada em si mesma e nada além disso. Tudo o que possa interferir em nosso prazer deve ser afastado de diante de nós: Deus, caráter, personalidade, honradez, retidão, verdade, etc. Se alguma dessas coisas nos afasta de meu prazer, tiremos isso da frente! E o hedonismo com toda sua desfaçatez, entrou sem pedir licença na Igreja cristã, onde encontrou um cálido nicho onde se instalar e virar um dos ídolos cristãos da pós-modernidade. E assim, de maneira insuspeita e natural, chegamos aos efeitos do hedonismo na Igreja de Cristo.


  • Os casamentos se desfazem: não davam mais prazer, então é melhor acabar...
  • As pessoas se casam em jugos desiguais: não haveria prazer em passar o resto da vida com um cônjuge cristão...
  • A espiritualidade se perde: não dá prazer buscar um Deus que exige santidade...
  • Muitas igrejas sérias se esvaziam: não dá prazer ouvir um sermão sério baseado na Bíblia...
  • Muitas igrejas falsas se enchem: dá muito prazer ouvir vez após vez que somos os tais e que Deus trabalha para nós...
  • As classes de estudo e oração não acontecem: que prazer há em aprender a Bíblia e orar?

E assim, a roda da História vai se movendo de forma constante, porém imponderável. Pelo desejo desenfreado em obter prazer pelo prazer podemos explicar o Éden caído, as guerras insustentáveis, as desigualdades absurdas, os flagelos humanos, o narcisismo, a entrega aos vícios, o relativismo das vidas pós-modernas, a banalização do ser humano, a irresponsabilidade, a mudança do modelo das relações humanas, a gula, etc, etc.

Chegamos ao tempo em que seremos chamados de volta à nossa responsabilidade cristã e teremos que responder a Deus, queiramos ou não, com ou sem prazer, o que temos feito com a vida que Ele nos deu a viver. E precisaremos responder a Ele porque não vivemos apenas repetindo o verso 174 do Salmo 119: “Suspiro, Senhor, por tua salvação; a tua lei é todo o meu prazer”.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

QUANDO NADA É MUITA COISA

Joel Theodoro é pastor presbiteriano no Rio de Janeiro
Imagens: www.flickr.com

De vez em quando nos deparamos com situações em que pessoas resolvem entrar em guerra por coisa alguma, fazendo de sua vida uma desgraça verdadeira como se aquilo pelo que lutam fosse um pote de ouro. A coisa é séria!

Toda vez que vejo isso acontecer perto de mim eu me lembro de Cândido, do Voltaire. Um lugar edênico em forma de castelo que não valia coisa alguma, mas que era, para o jovem Cândido, o mais maravilhoso de todos os lugares. Um quase-filósofo, Pangloss, metido a filósofo, que não passava de uma caricatura de pensador. A mais bela de todas as musas, Cunegondes, descobre-se depois, era feia por fora e por dentro, embora Cândido continuasse a percebê-la de forma especial.

No meio da jornada do infeliz Cândido, o mais otimista de todos os infelizes, há castigos, chicotadas, guerras, desgraças, Eldorados perdidos e um monte de outras coisas fantásticas brotadas de imaginação crítica de Voltaire.

Pois bem, é dos modernos Cândidos que falo: gente que se agarra a nada com a gana de quem achou seu Eldorado. Muitos fazem isso à custa de muita dor, de muita confusão e, pior ainda, de muita decepção alheia. Quando isso acontece na igreja, ainda mais triste é a história toda.

Para muitos a pequena paróquia é a o seu castelo do qual jamais quererá partir, como Cândido tampouco queria deixar o seu castelo onírico. O mundo, se sair dali, perde sentido, cai, desmorona e desaparece. Adoecem os Cândidos e perdem o rumo da vida. Por que? Porque sua razão de vida era um castelo que não é seu, mas que se apossa dele como se o fosse. Porque sua vida fora dali não tem sentido, e por isso se agarra para ficar. Porque a vida lá fora é estranha e perigosa, cheia de desafios e desatinos: logo, precisa ficar à sombra da proteção pretendida. Com isso perde-se a chance de crescer. Perde-se a possibilidade de alcançar o que está logo ali e não se alcança porque a acomodação bateu ao coração.

Em termos de vida, bem como em termos de igreja, não podemos viver como se o nada fosse muita coisa, mas precisamos crescer para que qualquer coisa, com Deus e com o equilíbrio de nossa vida, ganhe muito sentido. Precisamos fazer do pouco algo com sentido, mas o nosso tudo só pode residir na pessoa de Deus. Fora isso, coisas importantes passarão diante de nós, todas sem sentido, se Deus ali não estiver. Precisamos pensar mais nisso e deixar de fazer do nada um quase tudo para nossa vida.

Que o nosso castelo não seja um monte de ruínas enquanto sonhamos com um palácio.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

SUA IGREJA ANDA CHEIA?

Joel Theodoro é pastor presbiteriano no Rio de Janeiro
Imagens: www.flickr.com

Não sai de nossa cabeça a ideia dos números. Temos a mania de pensar grande e, se não pensarmos assim, somos pífios e mesquinhos. Abrimos mão da bênção se não sonharmos enorme e de jeito mega.

Quando encontro algum conhecido de igreja que não vejo há tempos, há duas perguntas inevitáveis que saem de seus lábios. Honestamente sempre as fico esperando e não dá outra: elas irrompem como lava de um vulcão:

- Em que igreja você está? Aí eu respondo, meio língua entre os dentes, porque sempre me pergunto lá por dentro por qual motivo a pessoa quer saber disso. No fundo, acho que é para saber se estou na mesma cerca que ela ou se “traí” a minha origem. Sei lá!

Não demora, mal respondida a primeira, ouço a segunda pérola:

- E a igreja vai bem? Tem muita gente? Lá vou eu de novo, pelas beiradas, sem querer ser deselegante com quem não vejo há muito tempo. Para que quer saber? Para comparar números? Para imaginar receita? Para saber se a minha igreja está “perdendo” para a dele? Para saber se estou sendo abençoado?

Essa é uma daquelas confusões que pairam sobre as cabeças dos protestantes, influenciados pelos novos movimentos evangélicos modernos com sua mania de tornar matemático o que é espiritual.

Atos 2.42-47 diz claramente que o povo cultuava com alegria e coração simples, louvando a Deus, participando da vida comum e levando e doutrina a sério, enquanto o próprio Deus acrescentava à Igreja os que iam sendo salvos. Não por ações ou estratégias humanas, mas pelo chamado de Deus. Um pouquinho antes, no verso 41 há a citação de que ingressaram na Igreja, de uma só vez, quase 3 mil pessoas. Elas não sofreram influência de marketing nem correram na esperança de ficar ricos pelas promessas de prosperidade, mas simplesmente atenderam ao apelo contundente de Pedro que lhes disse “Salvem-se desta geração corrompida!”

No mesmo livro temos o contraste de Filipe, que deixa tudo para pregar para um sujeito sozinho no meio do nada. Se lermos o capítulo 8 com atenção, veremos que Filipe estava em pleno desempenho de seu ministério, inclusive com fartos sinais sendo vistos através de sua ministração: ele anunciava o Evangelho a multidões em centros urbanos (vv.5,6), onde curava enfermos e expulsava demônios (v.7) e gerava convertidos que depois batizava (v.12). No auge de tudo isso, ele recebe a ordem para ir a uma estrada deserta. Filipe obedece e vai ao encontro de uma pessoa sozinha simplesmente para lhe explicar o que a Palavra de Deus estava dizendo em certo trecho. Como resultado, o oficial africano foi salvo e batizado ali mesmo, bem no meio do nada.

Acho difícil um desses que me faz as perguntas acima aceitar que Filipe devesse realmente deixar as multidões para pregar a um só no meio do vazio. Deixar as megaigrejas, as teleigrejas, as grandes concentrações de gente, a visibilidade, a abastança para pregar a um só no meio do nada, sem luzes e refletores, sem mídia e sem noticiar o que fez: posso até ouvir essa gente dizendo que é “coisa do inimigo”. Afinal de contas, “sou cabeça e não cauda!”, “tudo posso naquele que me fortalece”, “sou mais que vencedor”, “a vitória é nossa”, “devo tomar posse da bênção”, “tá amarrado”, “já determinei a vitória e a bênção” e mais um monte de frases soltas, sem relação de contexto com a Bíblia ou com a história da Redenção.

E termino me lembrando de algumas igrejas cristãs, cujos nomes apenas lembrarei dentro de mim, mas que estão em toda parte do globo e que estão nos grandes ramos do cristianismo: lotadas de gente, cheias de dinheiro, repletas de projetos e planos de expansão, mas totalmente esvaziadas do real sentido transformador da Palavra de Deus. Como dizia um amigo meu, o desserviço que prestam ao Evangelho é infinitamente maior que qualquer benefício que possam trazer.

Ah! Como digo a alguns mais próximos, um dos benefícios de ficar mais velho é que eu posso me dar alguns luxos. Não respondo mais às perguntas que mencionei, ou algumas de suas “primas”. Portanto, se você não se encontra comigo há tempos, não as faça. Eu me darei ao luxo de, alegremente, não as responder a você. Mas, se resolver respondê-las, também alegremente poderei apenas dizer que estou na igreja em que Deus me colocou, onde louvamos e cultuamos a Deus de forma simples enquanto cuidamos da doutrina que Ele nos deu.