terça-feira, 16 de agosto de 2011

SUA IGREJA ANDA CHEIA?

Joel Theodoro é pastor presbiteriano no Rio de Janeiro
Imagens: www.flickr.com

Não sai de nossa cabeça a ideia dos números. Temos a mania de pensar grande e, se não pensarmos assim, somos pífios e mesquinhos. Abrimos mão da bênção se não sonharmos enorme e de jeito mega.

Quando encontro algum conhecido de igreja que não vejo há tempos, há duas perguntas inevitáveis que saem de seus lábios. Honestamente sempre as fico esperando e não dá outra: elas irrompem como lava de um vulcão:

- Em que igreja você está? Aí eu respondo, meio língua entre os dentes, porque sempre me pergunto lá por dentro por qual motivo a pessoa quer saber disso. No fundo, acho que é para saber se estou na mesma cerca que ela ou se “traí” a minha origem. Sei lá!

Não demora, mal respondida a primeira, ouço a segunda pérola:

- E a igreja vai bem? Tem muita gente? Lá vou eu de novo, pelas beiradas, sem querer ser deselegante com quem não vejo há muito tempo. Para que quer saber? Para comparar números? Para imaginar receita? Para saber se a minha igreja está “perdendo” para a dele? Para saber se estou sendo abençoado?

Essa é uma daquelas confusões que pairam sobre as cabeças dos protestantes, influenciados pelos novos movimentos evangélicos modernos com sua mania de tornar matemático o que é espiritual.

Atos 2.42-47 diz claramente que o povo cultuava com alegria e coração simples, louvando a Deus, participando da vida comum e levando e doutrina a sério, enquanto o próprio Deus acrescentava à Igreja os que iam sendo salvos. Não por ações ou estratégias humanas, mas pelo chamado de Deus. Um pouquinho antes, no verso 41 há a citação de que ingressaram na Igreja, de uma só vez, quase 3 mil pessoas. Elas não sofreram influência de marketing nem correram na esperança de ficar ricos pelas promessas de prosperidade, mas simplesmente atenderam ao apelo contundente de Pedro que lhes disse “Salvem-se desta geração corrompida!”

No mesmo livro temos o contraste de Filipe, que deixa tudo para pregar para um sujeito sozinho no meio do nada. Se lermos o capítulo 8 com atenção, veremos que Filipe estava em pleno desempenho de seu ministério, inclusive com fartos sinais sendo vistos através de sua ministração: ele anunciava o Evangelho a multidões em centros urbanos (vv.5,6), onde curava enfermos e expulsava demônios (v.7) e gerava convertidos que depois batizava (v.12). No auge de tudo isso, ele recebe a ordem para ir a uma estrada deserta. Filipe obedece e vai ao encontro de uma pessoa sozinha simplesmente para lhe explicar o que a Palavra de Deus estava dizendo em certo trecho. Como resultado, o oficial africano foi salvo e batizado ali mesmo, bem no meio do nada.

Acho difícil um desses que me faz as perguntas acima aceitar que Filipe devesse realmente deixar as multidões para pregar a um só no meio do vazio. Deixar as megaigrejas, as teleigrejas, as grandes concentrações de gente, a visibilidade, a abastança para pregar a um só no meio do nada, sem luzes e refletores, sem mídia e sem noticiar o que fez: posso até ouvir essa gente dizendo que é “coisa do inimigo”. Afinal de contas, “sou cabeça e não cauda!”, “tudo posso naquele que me fortalece”, “sou mais que vencedor”, “a vitória é nossa”, “devo tomar posse da bênção”, “tá amarrado”, “já determinei a vitória e a bênção” e mais um monte de frases soltas, sem relação de contexto com a Bíblia ou com a história da Redenção.

E termino me lembrando de algumas igrejas cristãs, cujos nomes apenas lembrarei dentro de mim, mas que estão em toda parte do globo e que estão nos grandes ramos do cristianismo: lotadas de gente, cheias de dinheiro, repletas de projetos e planos de expansão, mas totalmente esvaziadas do real sentido transformador da Palavra de Deus. Como dizia um amigo meu, o desserviço que prestam ao Evangelho é infinitamente maior que qualquer benefício que possam trazer.

Ah! Como digo a alguns mais próximos, um dos benefícios de ficar mais velho é que eu posso me dar alguns luxos. Não respondo mais às perguntas que mencionei, ou algumas de suas “primas”. Portanto, se você não se encontra comigo há tempos, não as faça. Eu me darei ao luxo de, alegremente, não as responder a você. Mas, se resolver respondê-las, também alegremente poderei apenas dizer que estou na igreja em que Deus me colocou, onde louvamos e cultuamos a Deus de forma simples enquanto cuidamos da doutrina que Ele nos deu.

2 comentários:

  1. Ótimo texto Joel. Se cada um se preocupasse só um pouquinho com este tema, acredito que teríamos mais fiéis e menos membros de igreja.

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  2. Pois é, Gabi. Ser membro de igreja e comungar com os irmãos deveria ser consequência do ser fiel a Deus.

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